A Agonia do Eros e o Outro
Em “Agonia do Eros” Byung-chul Han se volta mais crítico ao capitalismo e de como ele transforma o amor e o “outro” em mercadorias em seu bel-prazer com auxílio também da pornografia e a objetificação. Contudo, é possível fazer um recorte racial em cima esse livro, afinal Byung-chul Han é sul-coreano que se mudou há anos para a Alemanha onde se formou e reside até hoje. É esse o foco dessa resenha.
Quando ele fala da presença de um “Outro” ele pode simplesmente se referir a qualquer outra pessoa, mas se usarmos da teoria interseccional podemos compreender que ele, como filósofo, fala de suas próprias vivências de um corpo amarelo vivendo em um país europeu com uma população branca (e loiros de olhos azuis em sua maioria.)
É possível imaginar pelas nossas próprias experiências pessoais o que ele pode ter vivenciado em seus anos de faculdade, trabalho e, claro, com as relações amorosas. Em Agonia do Eros, Han fala sobre a narcisificação do si-mesmo e de como o outro acaba desaparecendo e assim como em “Sociedade do Cansaço” acaba se baseando em sua teoria da Ditadura do desempenho, de como somos autoexplorados e isso também se recai sobre o amor que se baseia na sexualidade como desempenho e se equiparando a uma mercadoria.
O outro é sexualizado como objeto de excitação.
Nisso, entramos na fetichização de corpos racializados. Enquanto há cada vez mais Narcisos se fechando para o “outro” e buscando um amor igual, isso pode facilmente ser relacionado com o fato dos padrões estéticos serem pré-estabelecidos na socialização do Eros, somos acostumados a achar um tipo de pessoa bonito (branco, magro, alto, etc) enquanto qualquer pessoa que diverge desse tipo acaba sendo esquecido até o momento em que ele é posto como um prêmio, uma figurinha a ser completada em seu vasto álbum.
Ao ler esse livro ficou claro a intenção (quase que subconsciente) de retratar o apagamento e a transformação do corpo como mercadoria, algo a ser consumido e de como isso é muito mais forte em cima de pessoas racializadas (homens em menor escala e mulheres muito mais fetichizadas). Projetando o desejo do corpo ao invés de ver a pessoa no corpo.
Como uma pessoa amarela, desde a infância há o sentimento de não-pertencimento e questionamentos sobre a aparência fossem recebidos estímulos positivos ou negativos, muitas das relações que tive da adolescência até a vida adulta foram com pessoas que me enxergavam mais como um corpo amarelo do que como o que eu sou de fato, uma pessoa cheia de individualidades e gostos pessoais.
Contudo, tudo o que viram foram um sobrenome nipônico, uma viagem ao Japão com um visto facilitado e a oportunidade de se relacionar com um japa, não comigo, mas com um japa e poderia ter sido eu ou qualquer outro, quanto mais afastado da cidade de São Paulo o número de amarelos diminui e fica um “produto” mais raro e escasso valorizando (em um sentido fetichista e consumista) aqueles que se encontram.
Esse foi o segundo livro que eu li do Byung-chul Han (o primeiro foi o já clássico moderno Sociedade do Cansaço) e eu gostei bastante da forma como ele escreve, de maneira bem simplificada de fácil entendimento e sempre com muitas referências de filósofos clássicos, a sua tese da sociedade do desempenho e de como isso afeta as relações interpessoais e intrapessoais é ótima e esclarecedora, muitas coisas que eu já sabia ou tinha uma ideia e que, de certo modo, foram embasadas por sua pesquisa e também muito repertório acrescentado a minha própria vivência.